sexta-feira, 14 de agosto de 2015

o som das letras

                          o som das letras      
1.       Já dizia João Domingo de Catende: ‘ pois é poeta, na moeda do avarento o diabo tem quatro patacas!’ Achei bem a proposito a citação redargui dizendo: -  ‘ Não é o que você juntou, amigo  Domingo , e sim o que você espalhou que irá refletir como viveu sua vida.’ O diálogo termina aqui a prosa começa ali. Ele se pôs pensativo , olhou-me  de soslaio, eu fitei o seu semblante que o tempo imprimiu marcas... Ele depois de um longa baforada em seu cigarro de palha, observou a fumaça que subia em caracol , tomou um gole da pinga alterosa, pigarreou e balbuciou: - verdade seu poeta! Ah! Se pudesse voltar o relógio iria consertar tantas coisas passadas...
2.       Infelizmente não lhe foi dado o desejo, na semana seguinte envolveu-se numas intrigas de terra lá para as bandas do Riacho Velho distrito  de Roseiral do Norte e um certeiro tiro de carabina, plaft, o vitimou.
3.       Ao saber do acontecido lamentei profundamente, senti um aperto no peito e parece que alguém da família tinha partido, nunca mais veria aquele homem de temperamento calmo, mas astuto que só ele. Nem ao menos tive a chance de prestar-lhe a homenagem devida . Retornara à São Paulo uma semana antes do acontecido, foi Moura do bar jornal que me avisou. Me pus a cismar quieto naquele momento acerca  da fugacidade da vida, das idas e vindas da existência de cada pessoa, na precariedade das ações, mesmo das ciladas desta vida ‘marvada’.
4.       É Moura meu amigo, eu lhe pergunto será que o ser humano poderá conhecer inteiramente o sentido de tudo isto? – Acho que só os santos  e os poetas talvez um pouco, respondeu da outra mesa Luiz de Tânia.
5.       Ah a façanha de qualquer um é mínima comparada a amplidão do universo, o pensamento que vai e volta na minha cabeça tonta e do semelhante. Ah! Realmente as ações se tornam apenas fomentos da vaidade. Por isso seu Luiz de Tânia e Moura, meu chegado  afogo minhas mágoas na poesia e continuo convencido ser fugaz o som das letras...
6.       Domingo de  Catende amansava touro bravo na guachimba, potro novo para ele tinha endereço... do apreço não conhecia a cartilha, da ousadia o limite não estabelecia, diziam as más línguas que amealhara fortuna indevidamente, não sei ao certo, o fato que quando o conheci, já octogenário, faz uns quatro anos, estava estabelecido no mercado de bananas no arraial de Pedra Alta de  Santana na chapada Diamantina.
7.       Outros falam que há uns bons 30 anos atrás um tal de Tziu encontrou uma mala cheia de réis pagadores na para as bandas da represa de Nhô Ferreira. Por causa de que um aeroplano se colidiu com as torres de comunicação e deixou cair a fortuna em dinheiro vivo.
8.       Então Tziu encontrou a dita mala, e simplório com era foi procurar Seu Domingo e relatou o fato, e o nosso esperto cidadão disse que podia deixar que ele cuidava do caso e até prometeu-lhe  um presente , ah! Ah! Ah é,,, Dito e feito uns dias depois chamou Tziu e entregou a ele uma muda de roupa nova,,, Ele  coitado ficou contente e Domingo enricou à custas do dinheiro dos outros,  trabalhadores da usina hidro elétrica. E os dois não falaram mais no caso.
9.       A vida continuou seu curso amanhecendo varias manhãs cheias de sol, trinado de pássaros, e anoiteceu muita noites no sertão..  Na páscoa chuvosa de janeiro  do ano de 1979 toda a região de Alterosa sofreu com a cheia do rio novo horizonte e dizem que Tziu foi levado pela enchente... Outros relatam que desandou para a cidade grande na boleia do cargueiro RFSA e nunca mais foi visto, a quem diga que está enterrado numa cova rasa em Genipapo em Alto Parmacema, ah ah ah é ( expressão típica dele).
10.   Para Sr. João Domingo de Catende a vida sorriu demais, casou 3 vezes, pai de 13 filhos, possuía 13 cavalos alazões, que mais: 3 sítios de café, 3 armazens em Ribeira Cruzilha,. Viveu feliz, a consciência nem tanto, de quando em vez lembrava-se da fortuna conquistada na conversa, mas deixava para lá tal ideia...
11.   Na sua casa de alpendre alto tinha chaminé, fogão à lenha no arrimo, toucinho defumado, no armarinho da sala a pinga do lenhador, seu chapéu de vaqueiro dependurado no cabine de angico, e na gaveta a garrucha colt brilhava maliciosa... lá fora no terreiro de pedra o feijão em corda espalhado, mais à frente o paiol de milho e o moinho de fubá, o chiqueiro cheio de animais cevados, o galo, o cachorro e a meninada correndo um pulo solto.
12.   Mulher prendada arrumando a casa, o radio a pilha e as noticias da Capital Brasilia, no curral as vacas leiteiras e os retireiros de então, mais para a vertente as casas de pau à pique  dos colonos, no pasto o gado nelore enbranquiçava as noites de geada baixa, na mina a água cristalina.
13.   Tudo isto conseguido à custa de Tziu e do aeroplano desgovernado que veio justamente trazer aquele malote ‘premiado’. Mas o tinhoso não dá à toa o que parece ‘pois na moeda da avarento o diabo tem quatro patacas... 1 + 3, AH AH É ?
14.   Quando conheci Domingo  parecia estar sossegado e em paz com sua consciência, um homem alquebrado pela idade, de voz rouca, penteado alto, bom papo, fala mansa e de espirito irrequieto, originário da mesorregião da mata pernambucana bem na divisa do município de Palmares, Caatendi era sua  cidade natal, mas bem rapazinho se enfiou num vagão  da Great Western e foi para Recife.
15.   Perambulou pelas ruas, foi engraxate, entregador de jornal, virou mascate e na sua inteligência e vontade se balou para a zona da mata e lá se estabeleceu na  feira  de bananas até que recebeu das mãos de Tziu  a tal mala dos réis... Virou meu amigo numa destas andanças o encontrei num boteco e apreciador da pinga do alambique me ofereceu um gole da Rainha, entabulamos conversa animada e repentista da viola levamos um som afinado madrugada à dentro e muita poesia surgiu...
16.   Assim foi e hoje me alembrei dele com saudade, pois o finado Domingo no fundo era um cabra bom e tinha sentimento sincero, por isso a razão deste conto e tudo mais. E seu arrazoado tente entender e dividir nesta pauta das canções, nesta hora tergiversa porque passa os brasileiros, lembrar dele esfria nossa cabeça dos senões que se acumulam feio e parece que o freio à corrupção politica anda meio bambo.
17.   Luiz de Tânia e Moura ouviram tudo com atenção, nem piscaram seus olhos, mas podia sentir o pulsar da amizade que dedicavam ao velho João Domingo de Catende, e moura me dissera que sua ambição desmedida é que o matou, não precisava daquelas terras lá do Riacho Grande, aliás nem era dele, apossara-se delas, Deus sabe como?
18.   Luiz aquiesceu com a cabeça, disse que a última vez que o viu, não fazia muito tempo lhe aconselhara a fugir de encrencas, mas o cabeça dura do Domingo não dera ouvidos ao seu conselho e terminou por encontrar a noticia derradeira na carabina certeira do posseiro Tião das Neves, e terminou a palavra dizendo: - Moura meu amigo serve mais três tragos aí da ‘marvada’ e essa vai ser por minha conta pois ainda não bebemos ao morto, com respeito, Deus o tenha! AH AH AH É ! ! !
19.   Fico por aqui meus amigos que me escutaram com paciência e percorreram comigo a estória real acontecida na versão enunciada nesta empreitada literária, agradeço de coração mesmo, e continuo convicto ao pensar que ainda continua fugaz o som das letras.

Helder Tadeu Chaia Alvim





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